Literatura de Cordel
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Bandeira da Paraíba
Monografia
Autor: Valentim Martins Quaresma Neto

Capa
    Dedicatória
    Sumário
    Apresentação
Capítulo I   Capítulo II   Capítulo III   Capítulo IV   Capítulo V   Anexos
CAPÍTULO I

1. ESTUDO DA REALIDADE REFERENTE AO USO DA LITERATURA POPULAR NO ENSINO FANDAMENTAL

                Com a preocupação de conhecer a atual realidade sobre o uso da Literatura Popular nas escolas da região, especificamente no Ensino Fundamental, no período correspondente aos últimos quatro anos letivos(1998/2001), realizamos uma pesquisa em dez estabelecimentos de ensino da região: seis nos municípios paraibanos de Santa Helena, São João do Rio do Peixe e Triunfo; e quatro nas unidades municipais do Ceará, Baixio e Umari respectivamente. Os resultados apresentados pelas escolas pesquisadas servirão como amostragem de como foi o uso da cultura popular em sala de aula nos últimos quatro anos, e de base para nortear as discussões apresentadas no presente trabalho.

                A referida enquete obedeceu aos seguintes critérios: responderam aos questionários, quatro estudantes por unidade visitada, sendo dois da sétima série e dois da oitava. Dos 40 alunos pesquisados, obtivemos os números a seguir: perguntados sobre como foi o uso da Literatura Popular nos últimos quatro anos, 50% dos alunos afirmaram ter trabalhado com arte popular freqüentemente; 40% dos entrevistados responderam que as atividades utilizando a cultura popular foram às vezes exploradas; 10% dos estudantes disseram ter sido inexistente o trabalho envolvendo cultura popular nas unidades visitadas.

                Ainda na mesma pesquisa, indagados se conheciam alguns títulos de literatura de cordel ou algo que caracterizasse a cultura popular, 90% dos alunos registraram que nunca tinham tido contato com esse tipo de expressão artística e conheciam pouco outros tipos de manifestações típicas da cultura nordestina; 10% dos participantes conhecem a estrutura do cordel, leram alguns folhetos e sabem caracterizar a cultura do nordeste através de músicas, contos populares, danças, etc.

                Todos os alunos que preencheram o formulário da pesquisa foram unânimes em afirmar que gostariam de aprender mais sobre a cultura popular, especialmente, as manifestações culturais do Nordeste e solicitaram o uso da arte popular com mais freqüência nas aulas de qualquer disciplina. Como afirma a aluna Luzia Holanda, da sétima série da Escola Elaine Soares Brasileiro, Santa Helena - PB:

"Gosto das coisas simples que, infelizmente, estão sendo esquecidas no dia-a-dia. De quem é a culpa? A culpa é de todos nós que ao invés de valorizarmos o que é verdadeiramente nosso, estamos dando valor a outras culturas de fora. Se não valorizarmos a nossa cultura, quem vai valorizar? Gostaria muito que existisse um grupo de teatro em nossa escola   para podermos falar e expressar   mais sobre a alma do nosso   povo, que é a nossa cultura".

                Outro depoimento que nos chamou bastante a atenção foi escrito pelo aluno Francisco de Assis da Silva, 7a. B, da escola Elaine Soares Brasileiro, Santa Helena - PB, quando dissertava sobre suas raízes culturais, onde o mesmo lamentou profundamente a identidade cultural perdida e enfatiza problemas como o do alcoolismo que aflige tanto a nossa sociedade na atualidade:

"Os meus bisavós faziam leilões, passavam meses pedindo   contribuições em acompanhamentos, realizavam grandes festas comemorativas, tocavam em bombos e outros instrumentos musicais. Minhas tias vestiam-se de baianas e faziam coreografias para animar os participantes. Tocavam, dançavam e divertiam-se. Agora   não existe mais   nada, meus tios e primos, no dia 21 de julho, data comemorativa, apenas ficam embriagados, já não sabem mais tocar os instrumentos. Eu sei destas histórias porque minha mãe me contou. Isso nunca devia ter acabado porque pertencia a nossa cultura negra, era o nosso divertimento e até mesmo uma coisa muito bonita".

                Depoimentos dessa natureza fortalecem a idéia de que a educação não se preocupa com as questões que dizem respeito à cultura do povo. Não houve no município onde reside essa comunidade negra, que o Francisco de Assis faz referência, a preocupação em manter a tradição cultural existente. Como ficou comprovado, isso causa uma enorme perda para o desenvolvimento da cidadania e ajuda a empurrar as pessoas simples para o alcoolismo e à prostituição. Uma vez perdida suas raízes culturais, perdem também a dignidade e a vontade de viver no lugar onde nasceram, migram para outros centros, vão fortalecer o inchaço das grandes cidades, aumentar o número de pessoas que sobrevivem nas favelas, em condições sub-humanas de vida. É lamentável que a falta de pequenos incentivos provoquem problemas tão grandes. O povo marginalizado, na sua humildade, exige muito pouco, ou seja, um pedacinho de terra para plantar, poder alimentar-se regularmente, condições mínimas de trabalho, incentivo agrícola e cultural. Tudo isso se executa com poucos recursos, basta maior espírito de humanização e solidariedade por parte dos que governam a nação e maior engajamento dos trabalhadores.

                Curiosamente, das dez escolas pesquisadas, apenas os estudantes de uma, afirmaram conhecer a arte popular, justamente no estabelecimento que estamos lecionando a três anos e tivemos a preocupação de estudar junto com os nossos alunos usando a literatura de cordel, desde os conteúdos dos folhetos até sua confecção, teatro popular e música popular brasileira. Esse dado afirma o que já suspeitávamos, mesmo antes da pesquisa, que a literatura popular não tem tido espaço nas escolas públicas e/ou privadas do ensino fundamental. Por isso contestamos o resultado da enquete que realizamos. Os números apresentados não condizem com a realidade. Se 50% dos nossos educandos estivessem tendo um contato freqüente com a arte popular, não havia tanto desconhecimento sobre o folclore e a arte popular no meio estudantil e acadêmico, não existia tanta evasão escolar. A contradição fica evidente quando os entrevistados afirmam num item que estão estudando com o apoio da literatura popular e na questão seguinte confessam desconhecer as manifestações populares. Diante do exposto concluímos que, ou as respostas são viciadas e inverídicas ou os conteúdos trabalhados como literatura popular não foram originais e nem corresponderam às expectativas e necessidades dos educandos participantes do referido trabalho investigativo.

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