Entrevista a Ana Maria De: annamariapontes@ibest.com.br Bloquear endereço
Para: literaturadecordel@bol.com.br
Data: 10/07/2003 10:12
Assunto: Entrevista
Arquivos Anexos:
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João Pessoa 10 de julho de 2003

Caro Francisco Ferreira,


Primeiramente gostaria de me apresentar. Meu nome é Anna Maria. Sou aluna do 3º período do Curso de Turismo da UFPB. Neste período estamos estudando uma disciplina chamada Cultura Popular e Turismo e a Profª Zulmira Nóbrega nos pediu um trabalho referente a um exemplo de Cultura Popular do nosso estado e a relação existente com o Turismo. O tema que escolhi como o Sr. pode perceber é o cordel e durante minhas pesquisas encontrei um cordel de sua autoria e no intuito de enriquecer o conteúdo do meu trabalho e caso não seja de grande incômodo para o Sr., estou enviando as perguntas abaixo. De antemão gostaria de explicar o porquê de não ter feito a entrevista pessoalmente. Como expliquei ao telefone na Terça-feira, fiz uma cirurgia ontem pela manhã e o médico me receitou sete dias de repouso absoluto e como a data de entrega do trabalho é no próximo dia 14 de julho (segunda-feira) independente da greve, é que estou enviando esse e-mail com certa urgência. Ciente da sua cooperação de antemão agradeço ao Sr.

Atenciosamente,
Anna Maria


Entrevista – Francisco Ferreira Filho Diniz

1. Qual a sua naturalidade?

Santa Helena, Sertão da Paraíba, e está localizada a 60 Km de Cajazeiras.

2. Há quanto tempo o Sr. escreve cordéis?

Desde 2000.

3. Geralmente somos influenciados por algo que nos leva a escolher nossas profissões. O que o influenciou a fazer cordel?

Infelizmente ainda não tenho o cordel como profissão, pois não sobrevivo dele. Apesar de já ter mais de 15 títulos editados, um site na internet (http://literaturadecordel.vila.bol.com.br) com uma média de visitantes de 120 pessoas diariamente e materiais expostos em bancas de revistas, livrarias e lojas de artesanatos, o que percebo oriundo das vendas é insignificante. Sou professor de educação física da escola São Marcos, em Várzea Nova-Santa Rita-PB(229-3296). Faço folhetos por prazer e para contribuir para que no futuro ele possa se transformar numa cultura de massa, como era antigamente. Se isso acontecer terei orgulho em dizer que o meu sustento ou parte dele é proveniente da poesia popular. Desde criança leio cordel, como o faz todo sertanejo da minha geração e devido ao trabalho que desenvolvi, em Santa Helena, com o poeta Valentim Martins Quaresma Neto, de quem sou discípulo, comecei a escrever sempre dando importância a temática reflexiva da situação social e econômica do país e do mundo, mas tratando de vários assuntos (hilário, romances, histórias verídicas, o aspecto religioso, etc.).

4. Você possui alguma inspiração para versar seus cordéis? Qual (is)?

Temos uma preocupação de escrever sobre os mais variados tipos de assuntos e mesmo nos temas aparentemente sem conotação crítica, abordamos sobre os equívocos da sociedade e sobre as injustiças. A inspiração surge principalmente quando não estou cansado, quando tenho tempo, ou quando preciso realizar um trabalho em estado de urgência, por exemplo, quando Patativa do Assaré morreu, eu soube por volta de meia-noite e uma hora depois eu coloquei uma poesia em sua homenagem na internet. A obrigação de cumprir horário as vezes motiva a inspiração. Sempre que vou a Santa Helena num final de semana produzo, com Valentim, algum trabalho, como o tempo é pouco, passamos horas e mais horas elaborando os versos para poder concluir um folheto.

5. a)Quais os temas que o senhor prefere focalizar?

Como já citei, a questão social do povo, as injustiças e qualquer assunto que possa trazer uma mensagem reflexiva ou educativa.

b)Por quê?

Para provar o poder da literatura de cordel enquanto instrumento de educação, de informação e de entretenimento.

6. Seus cordéis são ótimos, além de possuírem um alto grau de conhecimento perceptível por qualquer um que o leia. Qual a sua opinião sobre a receptividade deles pela sociedade?

Agradeço o elogio, mas somente quando (ou se) um grande número de leitores conhecerem os títulos, discutirem e criticarem é que posso ter uma noção do real significado daquilo que escrevo.

7. Qual a sua perspectiva para o cordel no futuro? Ele irá se acabar, melhorar, ser mais lido, etc...?

Se depender de mim e de Valentim o cordel será revitalizado e conhecido por toda essa geração que hoje não sabe nem o que é. Para isso traçamos algumas metas:

I- Trabalhamos em nossas escolas divulgando e produzindo cordéis junto com os alunos. Na minha escola, São Marcos, em 2002 produzimos um título. Com os meus alunos da capoeira produzi um outro título, que inclusive o colocamos no cd que lançamos. Em 2003 já editamos dois cordéis. Todos eles estão disponíveis na internet.

II- Quase que semanalmente fazemos exposição de capoeira e/ou cordel em escolas e praças e lá lemos um ou mais cordéis.

III- Temos títulos a venda em sebos culturais, bancas de revistas, livrarias, em duas lojas de artesanato e em nosso site.

IV- Temos um projeto futuro de adquirirmos um serviço de alto falante para sairmos lendo versos pelas ruas.

V- Estamos buscando parcerias para a leitura de folhetos em rádios comunitárias.

VI- Criamos um site onde disponibilizamos atualmente mais de trinta obras gratuitamente.

8. Qual a sua opinião sobre outras formas de vender o cordel (pela internet ou através de livros, por exemplo)? A cultura, neste ponto é ferida?

Todas as formas de divulgar a nossa poesia são importantes. Temos que perceber que vivemos num momento histórico totalmente diferente do auge do cordel, onde a tecnologia imponente era o próprio cordel, pois o jornal, o rádio e a tv não chegavam à maioria da população. O cordel sendo exposto na internet, em jornais, em livros não se torna menor. Contudo temos um movimento para valorizar o folheto tradicional pois acreditamos que é preciso destacarmos a sua formatação e estética como um produto peculiar do povo do nordeste (da Paraíba em especial, posto que foi Leandro Gomes de Barros, da cidade de Pombal, quem primeiro editou os folhetos com tal configuração). Isso precisa ser conhecido, valorizado principalmente pela classe elitizada, que por ignorância, as vezes destrata a nossa cultura.

9. O cordel, na sua opinião, é um elemento essencial para a cultura paraibana? O que poderia ser feito para valorizá-lo e valorizar nossa cultura?

Sem dúvida! Assim como o forró autêntico, não essa bobagem que estão divulgando na mídia com o nome de forró eletrônico. Para tornar o cordel lido não podemos esperar por incentivos de organismos oficiais dos governos, uma vez que são poucos os administradores que têm sensibilidade para perceberem sua grandiosidade, mas será bem-vinda qualquer ação que contribua nesse sentido. Acredito que a escola é o ponto de partida para a promoção do cordel. Imagine se por ano todos os alunos do Brasil recebessem um título. Seriam dezenas de milhões de pessoas comentando sobre cordel.

10. O turismo, para o senhor, é prejudicial ou benéfico para a cultura da Paraíba como um todo? Qual a relação do cordel com o fenômeno turístico? Como essa relação pode ser percebida?

O turismo é uma faca de dois gumes. É vital para a economia mas se não for bem planejado pode causar sérios prejuizos a costumes e valores da população:

- Nas cidades onde há um fluxo turístico grandioso, vez por outra vemos noticiários de exploração de crianças;
- alterações na geografia do lugar para atender a interesses econômicos;
- inchaço de pessoas nas ruas causando poluição visual, poluição sonora, poluição ambiental;
- problemas relacionados à segurança.

No entanto o turismo estimulado em ambientes com uma boa infra estrutura e um povo educado para conviver com tal desenvolvimento, o resultado é obviamente satisfatório. Em relação ao cordel urge se estimular os autores a produzirem ao mesmo tempo que é necessário um trabalho de marketing para transformá-lo num produto de grande consumo na Paraíba como o acarajé e o berimbau na Bahia, a renda no Ceará, O churrasco no Rio Grande do Sul, o artesanato em todo o Nordeste...

Francisco Diniz
julho de 2003